O Jogo

A vida representa uma série de escolhas, como se um jogo se tratasse. Aqui a moeda é o tempo, mas existe uma espécie de twist, o jogo está viciado. Independentemente do investimento, nunca se poderá ganhar mais tempo e eventualmente no final, todos perdem. Todos os que arrancam para o jogo com a ilusão de querer ganhar são os que mais rapidamente perdem tudo. Quando aceitamos que já perdemos e passamos a jogar pelo momento, o jogo pelo jogo, damos por ela que cada retorno tem algo de valioso. Não perdemos nada, da mesma forma que andar numa montanha russa não se perde nada, apenas vivemos o momento e é isso que importa. Desde que estejamos continuamente a viver a vida como achamos que deve ser vivida, vamos perder na mesma, mas aproveita-se a viagem.

As pessoas que tive no passado, o gato, as viagens, as discussões, o sofrimento, foram tudo escolhas, tudo apostas, tudo experiências, tudo voltas no carrossel, que foram pagas com tempo e que são parte da minha vida, daquilo que eu sou. Pegar nisto tudo e pôr numa balança para medir o bom e o mau é ao mesmo tempo idiota e impossível.

Temos que viver, viver e ser felizes, apenas isso. Na vida não há propriamente uma tabela de resultados, X perdas e Y vitórias. Não existem prémios para quem ganha ou demérito para quem perde.

Quando perco, por exemplo quando terminei o meu casamento, falo sobretudo em reconhecer que acabou, que chegou ao fim e que não são mais apostas que vão salvar o jogo. Talvez uma boa analogia seja o ato de ler um livro sobre um herói que a cada página salva princesas e derrota dragões, mas no fim, na última página é morto pela princesa com uma facada enquanto dormia. Provavelmente vou-me sentir traído pelo livro, pela vida, mas a realidade é que a história não é apenas o fim, ele viveu a sua vida como quis, com grandes feitos... ou seja, o importante não é o fim, é a viagem que se fez.

Não se deve criar ressentimento para com o livro, para com a história ou mesmo em relação à vida, aceita-se apenas que acabou e siga em frente.

É tempo de aceitar. Fiz as minhas escolhas, algumas boas, outras nem tanto e agora acabou. Não ficou nada colocado em “pause”, não é algo que se possa salvar ou reviver... acabou. Aceitar isso é difícil porque todos nós queremos ver mais uma página onde o herói volta e evita que a mulher o mate... mas não.

A vida permite que se possa fazer de um estranho um amigo, mas também facilmente podemos transformar um amigo num inimigo. Grande parte dessas situações estão fora do nosso controlo, o que realmente importa é decidir quando devemos lutar ou quando devemos aceitar a perda e seguir em frente.

O mais fácil é enganarmos-nos a nós próprios e acreditar que podemos mudar o destino de algo que nunca esteve no nosso controlo. Esse é apenas um dos truques da vida para nos manter infelizes. Na realidade a única solução é aceitar a perda. Não é bonito, não é porreiro, mas a alternativa é insistir, lutar e correr o risco de perder ainda mais.

Não devemos pensar no tempo que se gastou com alguém, mas no que nos resta gastar (com quem quer que seja).

Todos nós sofremos todos os dias, muitas vezes pelo simples motivo de que respiramos. Temos que colocar essa dor em perspetiva.

Até ao fim ainda vamos perder, ainda vamos sofrer, ainda vamos dar voltas que vão fazer parecer o sofrimento de hoje em nada.

Uma das coisas que temos de fazer é acordar de manhã, fechar os olhos e respirar. Apenas a breve sensação de encher os pulmões. Algo que um dia não será possível fazer.

Tempo não se fabrica, por isso não pode ser desperdiçado.


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