Plantando a semente da mágoa

Minha querida mãezinha, depois de mais de 30 anos de vida, finalmente consegui compreender algo que aprendi com você. Algo que, apesar de eu considerar honroso e nobre, jamais imaginei ser também algo com um potencial tão pernicioso.

Durante toda minha vida, eu acreditei que era importante ser uma pessoa boa e fazer o bem. Sempre me espelhei nos seus atos e na sua atitude, com o intuito de fazer o bem no mundo.

Hoje vejo que isso não é uma constante. Fazer o bem, ou aquilo que nos parece ser o bem, nem sempre é algo bom ou algo que vai nos trazer resultados positivos.

Um erro fundamental que nós (quase sempre) cometemos, foi deixar de lado o nosso bem estar, para praticar aquilo que achávamos que era o bem. Ainda hoje fazemos isso.

Sempre nos sacrificamos em nome do bem alheio. Mas, por mais nobre que seja essa atitude, ela não é necessariamente saudável para seus praticantes. Principalmente se for um hábito, pois praticamos nossos hábitos sem pensar ou analisar.

Em nosso caso, acredito que embutimos este hábito em nossa postura emocional, e por isso sofremos a vida toda com isso, pois dificilmente agimos em nossa defesa. Defender às vezes significa dizer "Não!", e dizer "Não!" raramente dá a impressão de estar fazendo o bem.

É um equívoco fundamental, e requer muita coragem e sabedoria para ser mitigado. Ao dizer não, estaríamos protegendo algo interno, algo que nos é precioso. E quando deixamos de dizer não, permitimos que nosso coração seja ferido.

As pessoas vão naturalmente fazer escolhas que potencialmente podem nos ferir, mas permitir que tais escolhas atravessem a nossa guarda é uma decisão pessoal.

É ao achar que somos nobres e puros de coração que abrimos a nossa guarda. É num voto de confiança que acreditamos que as pessoas serão cuidadosas em suas escolhas. Acreditamos que a elas jamais escolheriam nos machucar, pois assumimos que elas agiriam conosco da mesma forma como nós agiríamos com elas.

Acho que hoje nós sabemos muito bem que as coisas não são assim, certo? Mas sabemos disso apenas intelectualmente, no nível emocional, não é assim que nos sentimos.

Um dia, inevitavelmente, o nosso coração será ferido por escolhas indelicadas feitas por outrem. E será muito mais fácil acusar o outro da dor que sentimos, do que assumir a nossa parcela de responsabilidade por ter baixado a guarda num ato de confiança e afeto.