A depressão não é apenas tristeza – muitas vezes é uma perda de prazer

por Ciara McCabe, The Conversation
Traduzido, adaptado e comentado por Susane Londero e José Cavalcante
Tempo de leitura: 6 minutos

#paratodasverem: uma mulher de cabelos pretos na altura dos ombros, de camisola e meias, sentada em uma cadeira, na frente de uma grande janela coberta de cortinas finas, que vislumbrar uma cidade ao fundo. Não é possível ver seu rosto, pois ela está voltada para a janela, em uma sala de piso de madeira, com um sofá branco na lateral. A imagem é monótona, aguada e triste.

No texto, você lerá que:

  • Anedonia é definido como o interesse ou prazer reduzido em todas – ou quase todas – atividades que uma pessoa desfrutava anteriormente.
  • Se uma pessoa tiver anedonia por pelo menos duas semanas de forma consistente, ela poderá ser diagnosticada com depressão – mesmo que não se sinta triste ou deprimida.
  • Recomenda-se que os casos de depressão leve sejam tratados com psicoterapia. Pessoas com casos mais moderados ou graves de depressão podem receber prescrição de antidepressivos.

Muitas vezes pensa-se que se alguém está deprimido, esse alguém se sentirá triste ou deprimido na maior parte do tempo. Mas o que muitos não percebem é que estes não são os únicos sintomas da depressão. Outro sintoma comum de depressão que às vezes é esquecido é a sensação de que você não acha mais interessantes ou prazerosas as coisas que costumava gostar.

Conhecido como anedonia, esse sintoma está presente em até 75% de adultos e jovens com depressão. Mas apesar de ser comum, esse sintoma continua sendo um dos sintomas mais difíceis de tratar e controlar.

Perda de prazer

Anedonia é definido como o interesse ou prazer reduzido em todas – ou quase todas – atividades que uma pessoa desfrutava anteriormente. Se uma pessoa tiver anedonia por um longo período de tempo (pelo menos duas semanas de forma consistente), ela poderá ser diagnosticada com depressão – mesmo que não se sinta triste ou deprimida.

Embora principalmente associada à depressão, a anedonia também pode ser um asintoma de outros distúrbios – como esquizofrenia, ansiedade e Mal de Parkinson.

Em entrevistas aprofundadas que meus colegas e eu conduzimos com jovens sobre a depressão, a anedonia foi descrita por muitos não apenas como uma perda de alegria, mas também como menos motivação para fazer as coisas. Para alguns, essa falta de motivação estava relacionada apenas a coisas específicas – como ir à escola ou ver amigos. Mas para outros, foi mais grave e sentiram que não queriam fazer nada – nem mesmo viver.

Mas apesar de quão preocupante a anedonia possa ser, muitas vezes não é o alvo principal do tratamento da depressão.

Recomenda-se que os casos de depressão leve sejam tratados com psicoterapia. Pessoas com casos mais moderados ou graves de depressão podem receber prescrição de antidepressivos. Embora todos esses tratamentos tenham como objetivo ajudar os pacientes a lidar e superar os sintomas, mais da metade das pessoas com depressão não respondem ao primeiro tratamento recomendado. Mesmo após a mudança de tratamento, aproximadamente 30% dos pacientes ainda apresentam sintomas.

Tem sido argumentado que uma razão para estas baixas taxas de resposta pode ser porque as técnicas de tratamento atuais não direcionam adequadamente a anedonia. A pesquisa também mostra que ter anedonia prediz recaída crônica de depressão. É até possível que alguns tratamentos antidepressivos possam piorar a anedonia.

Por que isso pode acontecer? Uma possibilidade é que os atuais tratamentos padrão se concentrem principalmente no tratamento de humor deprimido e processos cerebrais que sustentam o mau humor – mas não a anedonia. Por exemplo, o principal objetivo das psicoterapias, como a terapia cognitivo-comportamental, é reduzir pensamentos negativos em pacientes. Os medicamentos antidepressivos mais comuns também têm como alvo principal serotonina, que se acredita sustentar, em parte, como o cérebro processa informações negativas.

Comentário de José e Susane: no caso dos processos depressivos, a terapia cognitivo-comportamental e terapias do mesmo campo costumam utilizar também a técnica de ativação comportamental, que foca na motivação e na ação em busca de um enriquecimento das experiências de vida da pessoa.

Mas como a anedonia é a redução da alegria de viver, tratamentos como ativação comportamental (uma forma de psicoterapia) poderia ser melhor para a anedonia. Isso ocorre porque a ativação comportamental visa ajudar as pessoas com depressão a tomar medidas simples e práticas para aproveitar a vida novamente. No entanto, alguns estudos concluem que a ativação comportamental não é melhor do que tratamentos padrão no manejo da anedonia. Isto pode ocorrer porque a própria natureza da anedonia inclui uma falta de motivação – tornando difícil para os pacientes participar de qualquer terapia, mesmo formas que possam beneficiá-los mais.

A anedonia também tem sido associada a mecanismos de recompensa disfuncionais no cérebro. Como tal, os tratamentos que se concentram mais em melhorar a forma como o cérebro processa a recompensa poderiam ajudar a aliviar a anedonia de forma mais eficaz do que os tratamentos atuais.

Mas o sistema de recompensa do cérebro não é simples e, na verdade, envolve vários subprocessos – incluindo antecipação, motivação, prazer e aprendizagem sobre recompensa.

Problemas com qualquer um desses subprocessos podem estar contribuindo para a anedonia. Como tal, será importante que a investigação descubra como esses subprocessos operam em pessoas com anedonia para desenvolver melhores alvos de tratamento.

Opções de tratamento

Embora a anedonia possa ser complexa, isso não significa que não haja esperança para aqueles que são afetados por ela.

Por exemplo, a investigação mostra que as psicoterapias que focam no processamento de recompensas poderiam ajudar a reduzir a anedonia. Um recente estudo piloto também descobriu que um novo tipo de psicoterapia chamada Augmented Depression Therapy (ADepT) pode funcionar melhor do que a terapia cognitivo-comportamental no tratamento da depressão. Isso ocorre porque ela visa especificamente a anedonia, fazendo com que os pacientes se concentrem em suas experiências negativas e positivas.

Além disso, os antidepressivos que têm como alvo os neurotransmissores envolvidos no sistema de recompensa (como dopamina) podem ser mais adequados para pacientes com anedonia. Os primeiros trabalhos examinando drogas como cetamina, que pode afetar a atividade da dopamina, sugere que pode ser promissor no tratamento da anedonia.

E embora possa ser difícil encontrar motivação se você estiver passando por anedonia, tentar encontrar tempo para atividades ou experiências divertidas e agradáveis, como um hobby que você adorava - ou mesmo um novo hobby - pode ajudar a aliviar a anedonia.

Se você acha que tem anedonia - ou outros sintomas de depressão - é importante não ignorar seus sentimentos para que você possa obter ajuda e tratamento que você merece. Se não tiver certeza por onde começar, você pode tentar compartilhar como se sente com uma pessoa querida ou com seu médico.

Se você trabalha no TRE-RS e está buscando uma psicoterapia, podemos ajudar na busca das melhores opções de acordo com suas necessidades.


Fonte:
Depression isn't just sadness—it's often a loss of pleasure (The Conversation)
https://theconversation.com/depression-isnt-just-sadness-its-often-a-loss-of-pleasure-210429

Mais sobre:


You'll only receive email when they publish something new.

More from Mural Saúde Mental
All posts