J

J_Leyva

Em que anotação ficou perdida a minha face? Alguém acostumada a perder textos, seja por desorganização, seja intencionalmente, rsrs.

Perto demais

Quanta sede senti! Chegou tão perto Que me arrancou pedaços Nacos de carne Órgãos inteiros removidos Até a água vazou, sem parar Os cabelos O apetite O sono Alterados e faltantes Despedidas sem adeus Colo, flores, novas vertentes Partes novas, buracos velhos: Ganhei novos dentes ...
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Os limites da gaiola

Sartre tem sua liberdade Sem destacar, a contento, As condicionantes As limitações As escolhas difíceis A pele, as contas, o trabalho O medo, a classe, o horário A condenação a ser livre Explode em contexto Dentro de um encaixar Mais fácil, parece, Negar parte das escolhas Ainda que restritas às possibilidades Aceitar as rédeas Assumir o norte Escrever o sonho Sentir o tombar Lamber as cicatrizes: É tempo de voar ...
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Às mil vidas comidas

Devoro-te Mas não te decifro Cada mordida Sacia, um pouco, A inesgotável fome de vida Com texto bebo Sugo Revivo O de ontem e o de agora A oculta e a exposta O triunfo e a derrota Guardo-os na caixa Como melhores doces finos Saboreio os amargos Sofro com os pepinos Tento o banal e o divino Escreve tu também Para que eu possa te devorar ...
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Limitações

Quero te dar o mundo Quero falar os temores Quero sentir os cheiros Quero provar os amores Mas eu sou um cobertor curto Quero aprender todos os idiomas Quero experimentar todos os sabores Conhecer os mapas, ver as cordilheiras Explorar o céu e os astros E contemplar a criação Mas eu sou um cobertor curto Quero te dar meu rim E enquanto isso fazer um tratado de filosofia Quero aprender matemática E brincar com a imaginação Reter todas as memórias Mas eu sou cobertor curto Nesse devaneio h...
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EXPLOSÃO

Os desassossegos mudam Mas continuam na varanda Prontos para atordoar Um soco Movimento Movimento Movimento Uma esquiva Mais movimento Outro direto! Foge e bate! Nunca esquece de se proteger! Avança, vai! IMPACTO! Por que parou de pular? Por que decidiu lembrar? Por quê? Direto! Por quê? Jab, direto! Por quê? EX PLO SÃO! Mãos que acariciam Perdidas em ganchos Prontas para EXTRAVASAR Tem suor e silêncio na varanda: É tempo de sossegar. ...
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!Peras no te voy a dar!

Tu me pediste peras Mas eu só possuía olmos E os servi com carinho Reclamaste do esconder da casca E me mostraste teus vincos Para me dar coragem de exibir os meus Desconfiada Deixei-te acompanhar alguns sulcos Os de alegria Os de infância Os de mordidas também Fortaleci-me Numa tempestade, contudo, Mostrei parte de superfície Que parecia muito machucada Não veio guarda-chuva Somente um pedido, torto, por mais peras E uma fúria pelo silêncio anterior A intempérie passou Guardaste os respin...
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Jardinagem

Os sinais de erosão Vêm da falta de raízes E do excesso delas Deixá-las criar E sem perceber Saborear o rasgar Vem a chuva. A terra aquece: Uma semente germinou A alegria do nascer O amor em cultivar O acidente a prosperar Chega nova estação Algumas plantas Perdem-se a intempéries O prazer em partilhar É incapaz de antever A dor pela mudança A flor nascida Talvez num mesmo arrebol Deixou o olor Marcas de espinhos Nada mais. Ver a passagem É o preço sentido Da arte de jardinar *A...
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Comendo papel

Mastigar as fibras de celulose Sentir as texturas Mas não a seiva da árvore O sabor não chega: Ainda que haja sal lacrimal é menos do que o suficiente Na ausência, na dor e no medo Resta provar à força Em busca de algum nutriente Os dentes se movem Já que não podem gritar A garganta, que poderia fazer algo, emperra Se nega a engolir O estômago reclama Os olhos doem E a cabeça flutua Corpo no papel, O resto a levitar. Longe, perto, muito apertado É preciso triturar Destruir as provas Até ...
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Figueirinha

Se os figos não caíssem Seria sempre a mesma estação Não haveria novas figueiras Tampouco adubo no chão Aquele mais suculento Que caiu e lambuzou tudo Aliviou o galho, tão curvo E redistribuiu nutrientes A renovação trará novo verde Crescer, podar, mudar raízes Sofrer com as intempéries E, ao final, com a casca seca Celebrar: Vivi. ...
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Um sol

Eu sou um sol Mas você demanda um satélite Escolhi continuar a brilhar ...
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O que aprendi nas terças-feiras

Nas terças não se vê sol Tampouco se almoça A estafa torna as noites perigosas O vazio existencial A apatia A vontade de colo O desamparo O desejo de silenciar-me Aprendi que voar só No dia de Marte É um péssimo caminho As palavras dizem "tudo bem" Até a solidão engolfá-las Com seu silêncio e sua escuridão Um dia tríti Que pede "Lola, descanse" Do trabalho E das memórias cortantes Um dia de guerra Interna e externa Tanto elogio Tanta letra morta Um olho no olho Ou a falta dele: Delí...
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TERMO DE CONSENTIMENTO PARA DOAÇÃO DE RIM E AFINS EM VIDA

Declaração de Vontade Livre e Espontânea Eu declaro, para os devidos fins, que autorizo, por livre e consciente vontade, a retirada de um dos meus rins ou mesmo de outras partes não renováveis, com o objetivo de doar os pedaços a quem carrego no peito e quero ver vivo e bem. A doação também atende o propósito de manter a vida e a qualidade de vida de joias raras que encontrei, ainda que o brilho não chegue mais aos meus olhos distantes. Fui devidamente informada sobre os riscos cirúrgicos, po...
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Escondendo o show

Luzes e músicas tristes Com disfarces e embalo O sentimento do violão A emoção de morte A atenção do palco O soco da canção O tremor do refrão O ocultamento na multidão Muito intenso e finito Tudo a esconder Um choro sentido Um olhar completamente perdido ...
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Ausência Presente

Não atendo o entregador Porque na casa que moro Jamais verdadeiramente estou Posso ser meu próprio lar? Embora as flores do jardim Não sejam plantadas por mim? As paredes que me protegem As janelas que me mostram o além Todas elas estão dentro e fora O telhado que me abriga Foi feito por mãos amigas O cobertor que me aquece É feito de sonhos, de amor e de prece Defino-me pelo interior Em contato com o afeto Com a casta Com a cor Com o meu cerne trabalhador Com as horas que me roubam Com...
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Escapes

Me treinei para te esquecer Para tanto Bloqueei telefone Impedi mensagens Excluí conversas Escondi as fotos Refiz meu mural Evitei nomear Recorri até à IA Mas ainda teimas em aparecer nas frestas E invadir meu travesseiro Para um café e uma conversa Num universo flutuante e passageiro Reforcei o treino para não lembrar Busquei novas atividades Apoio, cultura, carinho Socos, jabs, escrita Música, corda e vinho Não deixei espaço físico Para transbordares Tampei com suor Com pílulas Com...
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A várias mãos

À deriva, as lágrimas dificultam a vista A garganta trancada É anúncio de tempestade Que teima em retornar Mas quando você me estende a mão A humanidade que você me oferece Me traz para o agora Eu vejo em você terra em um mundo afogado Sinto que é possível navegar Vislumbro a dor e o tumulto nos teus olhos Que diferem dos meus E a tua mão amiga me conta Que não estamos sós O tremor descompensado reduz Há calor, há um outro, ali, a sentir É quando a ilha acha que virou península E, na v...
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Uma vida de sorte

Quero cuidar de minhas amizades Colocá-las em altares confortáveis Defendê-las das intempéries Honrar a sua confiança Dar-lhes meu coração Minha energia Minha proteção Quero guardar seus sorrisos Seus cheiros Sentir os abraços Ouvir as tristezas E cantar todas as vitórias Quando estiver apática Distante Caída Soterrada Silenciosa, talvez Ainda as quero bem Com todo meu amor Criem ramos, Criem flores! Dou-lhes minha espada E minha casa Por serem um norte Aos compositores De uma vida de ...
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O desejo de desejar

O desejo de flor O desejo de morte O desejo de sorte O desejo de dor O desejo de desejar O desejo de esquecer O desejo de me perder O desejo de encontrar O desejo de aurora O desejo de respirar O desejo de acalmar O desejo de ir embora O desejo da risada O desejo do sentir O desejo do partir O desejo da chegada O desejo de descanso O desejo de vida O desejo de saída O desejo de avanço O desejo de conhecer O desejo de renovar O desejo de morder O desejo de afrouxar Todos à espreita...
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Deceptrovões

Leu e espumou: Ondas altas, tempestuosas, Derrubaram o pedestal Indignada, bradou ao vento Espezinhando deuses caídos A chuva diminuiu O balanço reduziu-se E já era possível enxergar Para além da tormenta Que poderia retornar O barco permaneceu manchado Havia sangue na proa O sal do oceano Que também escorrida dos olhos Entrava-lhe pela boca Não esquecera das rochas Do perigo das geleiras Das incongruências todas Que, afinal, eram humanas Lembrou-se do mergulhar Dos desvios possíveis Dos li...
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No sul, não tem castor!

O tratado tão novo Planos, sonhos, filosofia Um pensava A outra escrevia Um fluxo constante De ideias novas Arranjos diferentes Liberdade a toda prova Tantos floreios Tantos amantes Verdade sem freios? Mentiras constantes Ao Castor (quase) tudo Alma amiga, tão presente Mas que ganhara rugas... Um segundo sexo decadente Amor que se transforma A família da aleatoriedade Congrega ódios, discrepâncias E aceita muita ociosidade Não é terceiro mundo É Paris, EUA, URSS Não tem ponto a bater Não t...
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Transparência Ficcional

Descobri que as histórias de Simone Falavam da vida que livre vivera Sylvia, em sua triste beleza, Trilhou o mesmo caminho Charlotte, destruída Foi outra amiga azul Que usou do mesmo papel Ou seria tudo amarelo? Jack cumpriu a tarefa na estrada Ferrante, nas ruas de Nápoles Bukowski, nos copos de bebida Como imaginar o distante? O âmago transparece Tão cru, tão tolo Sem forma, mas sempre forte! Ah, pobre do poeta Iludido em sua fantasia Que acha que fala do outro Com seu rosto estampado Na p...
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Rubato

Allegro ia bem Pulsante Corrente Eletrizante Energia, quanta energia! Suprimia intervalos O corpo funcionou ao largo Não aguentou Mas queria prestar Pediu outro tempo Ritardando, por favor! Almejava um desenvolver Moderato Es pa ça do Apreciado! Em resposta Encontrou-lhe accelerando! E a música acabou. ...
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Capitamor Livre

Tão individual Tão personalizado Tão ajustado a MIM Tão transformado em produto Que eu adquiro E me desfaço Sem o menor pudor Ao buscar e desfrutar Um salve à Hedonê Disfarçado de comunal Tem marca de posse Tem marca de gênero Tem cheirinho de liberal Não é monocultura Mas mantém o canavial Nega a romantização E fetichiza o ideal Uma ideia de coletivo Corrompida pelo capital Torna a (suposta) artesania Mais uma compra banal *Recomendo a música Carmen, de Stromae: L'amour est comme l'oise...
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Haicais ao Poe

Sombra na noite, A alma perdida chora, Poe, melancolia No escuro ecoa, "Nunca mais" a alma grita, Vento que se vai Nas trevas geme, Poe sussurra, vulto vai, Medo que devora. ...
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Indelével

A esquecer Mas a memória digital Persiste Reforça o ciclo. ...
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Haicai

Folhas caem em dor, vento sussurra saudade, Tempo que se foi ...
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Alguns Haicais Chuvosos

Tempestade vem O tempo muda o galho Silêncio no fim Cai a forte chuva lava a alma e a terra, o mundo respira de novo Águas se erguem, ruas viram grandes rios, broto renova ...
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A trapaça ao tempo

A taquicardia constante As cenas mudando e mudando e mudando A variação da velocidade O impacto na aceleração: não havia horas suficientes Submetida à Kali, tentou enganá-la para ganhar mais tempo Mas adianta acelerar Quando não se tem a direção? No altar colocou parcas moedas Depositou seu trabalho Derramou seu sangue Deixou seus cabelos Até o anel de família ficou lá A divindade não se moveu. Aos pés da senhora do tempo, da morte e da destruição, exausta, a suplicante deitou-se As lágrim...
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Lutando com Morfeu

Quebrada, sonhei: Era o que não fomos O futuro do pretérito O além natimorto No estômago, um soco Em novo ciclo de Morfeu Ao lado, mas nem tanto Teu triste sorriso, ao largo Encontrara minha música Que era pura proteção Outra apagar, outro imaginário Na rua partilhada Escondo-me na fila Me evitas, te evito Acordo enfurecida Espero o sono ansiosa Para a próxima interação Que venham novidades De amorosas despedidas Serão apenas saudades... ...
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Oração

Deusas e divindades Cheias de graça A luz é convosco Benditas são vocês entre as terrenas e benditos são seus frutos e flores Divindades, se existirem deusas, roguem pelas pecadoras agora e na hora da nossa morte Amém ...
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